Maestro, de Bradley Cooper
Maestro abre com uma citação do biografado, Leonard Bernstein, sobre a arte, dizendo:
“Uma obra de arte não responde a perguntas, ela as provoca, e seu significado essencial está na tensão entre as respostas contraditórias”.
Uma forma afetada do cineasta Bradley Cooper de dizer “vou retratar as contradições do protagonista” como se estivesse fazendo algo extraordinário em relação às cinebiografias hollywoodianas.
Parêntesis: Bem, levando em conta filmes como Bohemian Rhapsody, sobre Freddie Mercury, e Rocketman, sobre Elton John, contradição seja talvez algo de novo…
E assim como a cartela inicial, Maestro é todo ele afetado, eloquente, extravagante. Desde o evidente tom rebuscado das falas das personagens, especialmente Lenny, palestrando sobre vida e arte em vários momentos, ou maquiagem e figurinos, executados com um virtuosismo ao mesmo tempo chocante e invisível (como a técnica hollywoodiana assim requer); e, num campo menos chamativo, o trabalho com a imagem, mudando cores, texturas dos grãos e janela do quadro de modo a afinar a vida de Lenny com o desenvolvimento tecnológico do aparato cinematográfico.
Principalmente, a narração afetada de Bradley Cooper. O movimento virtuose quando o jovem Lenny é chamado para substituir o maestro titular, ainda no começo do filme. Ou o simples momento de um aviãozinho de papel jogado pelo vão do prédio, filmado em composição de quadro bem extravagante para um instante tão singelo. Ou ainda a conversa do protagonista com Felicia sobre seus “segredos”, com a câmera posicionada à distância no jardim, em perspectiva de sobre-enquadramento com os ornamentos vegetais, as personagens ao fundo, perdidas entre os muitos detalhes do plano, dando a sensação de estarmos invadindo a privacidade do casal.
Seriam muitos os exemplos possíveis… Planos e enquadramentos cujo sentido é identificável rapidamente apesar do maneirismo de sua construção. Bradley Cooper filma cada plano como se estivesse inventando o filme biográfico, a narrativa dramática ou, vá lá, o cinema todo. Quando, na verdade, está tentando esconder uma cinebiografia padrão, na qual o protagonista é, do início ao fim, uma projeção de sua persona pública na intimidade; o ator principal — no caso, o próprio Cooper — e toda a parafernália técnica estão mobilizados para uma imitação caricatural dessa superfície midiática de Bernstein transformada em personagem de uma grande empreitada cinematográfica. Um filme, no fundo, sobre salvação pelo amor heteronormativo. Obra sem muito mais a dizer sobre a arte senão aquilo dito já na cartela inicial.
Enfim, a pretensão despudorada de Maestro não passa do enfado.